Ia escrever batata doce com uísque, que está corretíssimo segundo a normatividade em vigor, mas como uma língua é muito mais do que uma norma geral – ô se é! –, achei que, no caso, soa mais apetitoso whisky.
Isso faz pensar sobre as relações entre o que dizemos e o modo como dizemos... sobre o quanto as formas também produzem conteúdos... sobre como essa normatividade está sujeita ao tipo de texto, ao tipo de assunto, aos interlocutores envolvidos, enfim, sobre como muitos elementos não-linguísticos estão inextricavelmente ligados aos elementos linguísticos... e por aí vai.
De todo modo, com whisky ou uísque, essa batata é tudo de bom!
Estamos em época de batata doce, na região Nordeste já experimentei coisas incríveis, e há um restaurante bonitinho toda vida por aqui que faz uma salada bem gostosa, mas batata doce não é uma coisa que se vê toda hora e quase nunca ela aparece com ares de festejo maior – ela tem algo de caseiro, de quintal, de casa da vó... Mas ela tem muito mais: vitamina C, betacaroteno (que vira vitamina A, antioxidante), alto teor de vitamina E, a casca ajuda na digestão (e já ouvi dizer que ajuda a baixar o colesterol, a verificar). Meu ponto aqui é que há muitas razões pra comer batata doce com frequência, sobretudo porque é uma delícia!
Neste caso, vamos fazer um purê (que é um negócio que costuma fazer sucesso, ainda mais em época de friozinho, né?). E os temperinhos vão fazer tudo parecer chic, très chic!
ingredientes:
- 6 batatas doces (eu tinha umas grandonas e outras pequeninas, pouco mais de ½ k)
- uns galhinhos de salsinha fresca
- um bom ramo de cebolinha (o meu era bem farto e tenro)
- um pouco (menos de 100g) de queijo ralado (usei queijo padrão, se usar parmesão, ponha bem pouco e cuide do sal)
- 1 colher de sopa de manteiga sem sal (usei ghee)
- 1 colher de café de sal marinho
- 1 potinho de iogurte natural (se for caseiro, fica mais saboroso)
- 1 dose de whisky
modo de fazer
Cozinhei as batatas (com casca, lavadíssimas) no vapor até o garfo entrar sem resistência na mais gordinha delas.
Enquanto elas estavam lá, juntei no liquidificador todos os outros ingredientes menos o whisky, que é o toque final. Bati bem, até obter uma pasta relativamente homogênea. Se quiser pôr um fio de azeite extra-virgem vai ficar ótimo. Eu me esqueci...
Batatas cozidas, corte-as em rodelinhas pra jogar dentro do liquidificador. Se a manteiga não tiver derretido bem na batida anterior, agora vai. E se seu liquidificador não aguenta o tranco de bater batatas, não use leite pra facilitar: o sabor característico da receita será afetado; prefira cozer um pouco mais as batatas e amassá-las com um garfão ou com aqueles espremedores, pois a ideia é um purê bem consistente, que se come com uma salada ardidinha e outros acompanhamentos apimentados ou azedos.
Quando as batatas e tudo o mais forem já um purê, é que se acrescenta a dose de whisky. Bate-se bem. Pronto.
Não fica com gosto de whisky. Por isso também não se deve usar muito tempero (nem pensar em cebola e alho, por exemplo), é o gosto da batata doce que, com o iogurte e o whisky, se acentua, se aprimora, sofistica... é batata doce, sim senhor. Por aqui fez o maior sucesso! Com os da casa e com uma visita querida que tivemos ontem. Ainda bem que tinha essa iguaria pra oferecer! Tão bom ver a visita saboreando alguma delícia da nossa cozinha, não é?
A salada que fiz tinha nabo e cenoura ralados, uns tomatinhos cereja em metades, folhas de acelga, rúcula e alface picadas, tudo bem misturado, regado a azeite grego. Super combinação!
Quem me deu a dica dessa receita foi um casal de amigos gulosinhos que sempre estão descobrindo coisas divinas. Eles me deram um presente lindo: um livro chamado The book of yogurt, de Sonia Uvezian. Adaptei uma das receitas dela.
Último toque: claro que não precisa ser um superwhisky caro, mas não use whisky ruim. É só uma dosesinha, mas ela é o spiritual e, convenhamos, se não for um espírito elevado, não vale a pena...
Luciana Salgado consegue traduzir com a simplicidade das palavras mais doces o sabor da comida e o prazer da boa convivência, tendo a cozinha lugar privilegiado para isso. Comer sob esse valor, o da simplicidade das falas, regadas ao bom-humor dos partícipes, só enobrece a comida e o homem que dela se alimenta!Caminhos tranquilos para o crescimento humano nesse mundo tão opaco! Abçs.André Mota
ResponderExcluirQue felicidade de receita, que felicidade poder experimentar o sabor dessa batata que é o contrário da "batata quente": é batata docemente espiritualizada e, portanto, partilhável ;-D
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