quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

os votos

Gosto desse rito coletivo de pensar que o novo vem, está vindo, que há razão pra respirar fundo, dar as mãos e sentir o corpo tomado do fôlego necessário pra seguir adiante.
Gosto da ideia de que há novos ângulos e entendimentos possíveis, de que a cegueira de uns pode se desfazer quando encontra a visão de outros, de que as inflexibilidades podem ceder e dar-se ao movimento...


Gosto da ideia de que podemos, despertados pelo rito, olhar de novo o que já passava despercebido aos nossos olhos, retomando a poética da existência, a dimensão estética do gesto de cada dia, que é também expressão da dimensão política de cada uma das nossas práticas...

Gosto de saber que teremos força pras descidas profundas, porque há sempre delas quando se está em movimento: transformar-se, como bem sabemos, exige! Não é apenas uma fala consciente que produz a transformação - ah, não é mesmo -, é uma convicção de outra ordem o que nos permite encarar o hades e só aí, então, poder fazer algo novo (que seja novo pra valer!) de nós mesmos.


Gosto de pensar que haverá tempo pra entrega - ora extenuados da luta (porque há disso em toda vida que se movimenta), ora aliviados pelas conquistas (porque há disso também na vida de quem se dá honestamente à luta).

Porque essa entrega é sempre prenúncio de subida, de retomada, de prosseguimento, de encaminhamento... dessas coisas que são a luz, a boa luz, a Luz.
Que nos permite estar confiantes diante das escolhas a fazer, que a todo tempo se põem, com mais ou menos importância, mas sempre decisivamente - nos usos do dia a dia, nos votos que fazemos, nos pensamentos que alimentamos, na vontade que partilhamos, na fé que cultivamos...


Que seja, então, um tempo de florescer com a singeleza que sustenta os grandes feitos. Afinal, não há ato heróico que seja mesmo fundador se não estiver apoiado nessa verdade miúda, construída a cada hora, a cada troca de partículas que acontece em nossas moléculas, a cada minúscula agitação que faz a inteireza de cada um de nós na relação ininterrupta com o que está à volta.

Que seja, enfim, um feliz ano novo!

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

"pudim" de manga pros dias quentes


Nossa, faz mais de uma semana que não dou conta de estar aqui, e não é porque a cozinha andou vazia, não. Houve nela muito trabalho por estes dias. Ô, se houve!

Mas é que também houve essa necessária distensão dos horários, dos menus, de tudo aquilo que é a vida ordinária – santa, diga-se. Acontece que a santidade deste momento do ano reside justamente em dar-se a outras experiências que não as de sempre, que não as automáticas, que não as cultivadas ao longo do ano. Acho que esse é o grande barato deste período: uma pequena subversão autorizada, coletiva, comungada.

Na minha família este ano o natal foi bonito, porque foi comedido, sem empanturramento de comida ou de presentes, tudo na medida, tudo expressando mais serenamente o bem-querer entre todos nós, tão diferentes que somos uns dos outros. Gostei.

(Ganhei uma batedeira sensacional. Bate uma clara em neve que só vendo!)

Pra ceia, este ano, fiz só um arroz parboilizado, mousse de manjericão, salada de folhas com nozes, “pudim” de manga, e minha mãe fez o tal do tender, um lombo com frutas, e comprou um pavê que é sempre sucesso na mesa dela.

Sobre a mousse de manjericão que levei pra lá, só acrescento à receita que já dei o seguinte: não há mais pacotinhos-padrão de agar-agar (gelatina), descobri outro dia; ele tem sido vendido a granel ou em pacotes grandes, então a proporção-base é a seguinte: 1 colher de sopa rasa para ½ litro de água.

Sobre a salada que fiz, nada demais, a montagem é que importa: alface americana rasgada com a mão em pedaços médios, alface lisa rasgada também, mas em pedaços menores do que os da alface americana, muitas folhas (sem os cabinhos) de agrião, duas fitas fartas de cebolinha cortada em pedaços bem fininhos, um bom cabo de alho poró também cortado fininho toda vida. Um fio de azeite, e mistura-se tudo bem misturado (os franceses dizem uma coisa que acho ótima: “fatiguer la salade” [é, isso mesmo, dar uma canseira nela, pra tudo ficar beeeem misturadinho]). Daí vêm as nozes esmagadas com as mãos (elas ficarão irregulares, é isso mesmo), o queijo branco ralado e umas poucas raspinhas de casca de limão e de gengibre (bem sutis). Mais um fio de azeite e remeximentos.

Crucial:

- a salada é sempre a última coisa a ser feita e sobretudo temperada, pra não ficar murcha e feiosa;
- essa “canseira” que se dá na salada é sempre com gestos delicados, a ideia é não macerar nenhuma folha, nunca;
- queijo branco ruim é sem gosto ou tem gosto de borracha velha, já os queijos brancos bons de verdade são muito saborosos – é destes que estou falando;


- secar as folhas (sobre um pano de prato ou naqueles secadores com manivela) é importante, pois elas não pegam tempero se estiverem molhadas – o que faz a maior diferença numa salada, né?


Sobre o tal do "pudim" de manga – que minha família praticamente não comeu, pois tinha o tal do pavê posando de gala... –, foi depois apreciado, de volta à minha cozinha, pelas visitas que vieram nestes dias quentes. Segredo nenhum: pra proporção-base de agar-agar (ver acima), quatro mangas maduras e cheirosas, mel (dos mais puros). Três das mangas descascadas e descaroçadas vão ao liquidificador com mel (não exagere, o mel é um ingrediente delicado, se passar do ponto, deixa a mistura meio ardida de tão doce), essa massa de manga será misturada à gelatina (um pouco com ela ainda bem quente), o resto depois que ela esfriar um tico, já vertido na fôrma final.

Daí, metade da quarta manga vai pro liquidificador com uma ou duas folhinhas frescas de hortelã, mais um tantinho de mel. Reserve (sem gelar!), pois essa será a cobertura depois que o "pudim" endurecer na geladeira – o que vai levar umas 3 horas, já sabemos...

A outra metade da quarta manga será cortada em quadrados irregulares distribuídos no fundo da fôrma (naquelas clássicas de pudim fica superbonito). Faça isso antes de verter toda a massa batida no liquidificador, claro.

Último toque: estando o “pudim” pronto, durinho e tal, faça uns furos com um hashi (aqueles pauzinhos japoneses) na parte de cima, indo quase até o fundo, e aí jogue o creme feito com a quarta manga. Não precisa pôr pra gelar antes de servir, não. Aliás, deixar fora da geladeira uns 15 minutos antes de servir é o ideal: fica só fresco, leve.

 
Agora vou pro terraço, conversar um pouquinho com as ervas.
Até!

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

suflê de couve-flor


Et voilà, é dia 21/12, já combinamos quem vai olhar os bichos de quem quando: os gatos e cães ficam assim neste período de festas, cuidados por amigos e amigos de amigos, o que é, para além de útil, um símbolo muito bacana da fraternidade, da corrente de bem-querer. Os bichos são sempre isto pra nós: lembram-nos da nossa condição humana; no caso, da humanidade em sua expressão mais singela, essa do amor de graça que devotamos a eles e, sobretudo, eles a nós; essa do carinho solto, do aninhamento caloroso, da alegria boa sem compromisso. Vivas aos bichos!
Só que foi tanto cafezinho e troca de chaves e instruções, além das despedidas cheias de votos de um ano bom, que o horário do almoço ficou apertado. E, na geladeira, umas últimas cenourinhas mais uma couve-flor esperavam com aquela cara de “é hoje ou nunca!” Então era hoje. Fomos de suflê, que é um jeito relativamente rápido de deixar linda e bem gostosinha qualquer conjunção de legumes.
Fiz assim: pus o arroz pra cozer (fiz aquele de vários tipos de grão, com cebolinha e alho poró – é só pôr uma fita de cada junto com o arroz, depois joga-se fora, na hora de servir); e também pus a couve-flor numa panela alta, com pouquíssima água no fundo, deixei-a semi-aberta (uns 10 ou 15 minutos em fogo baixo, só pra couve-flor amolecer, porque ela ainda vai assar); daí, no liquidificador, pus:
-       as cenourinhas (umas 4 ou 5 daquelas pequeninas, orgânicas, sabe?)
-       1 copo de leite (uso leite em pó desnatado, faço uma diluição mais pra forte)
-       1 farta colher de sopa de manteiga (uso a clarificada, de que falei ontem)
-       1 singela colher de sopa de farinha de trigo branca (que também compro da rede Sementes de Paz, de que falei outro dia; é uma farinha ótima!)
-       1 colherinha de café de sal (uso sal light ou marinho)
-       1 fatia gordinha de queijo (uso padrão ou meia cura pouco salgado)
-       1 belo dente de alho
-       1 cebola pequena
Bati bem.
Untei com um tico de manteiga e um tico de farinha de trigo branca uma forma (uso uma dessas redondas de cerâmica, o calor dela mantém o suflê “infladinho” por mais tempo – é que acho bonito, vê se pode!?) e salpiquei amendoim pra ser o fundo do suflê, dos graúdos sem casca. Com castanhas ou gergelim também fica delicioso!
A seguir:
-       separei as arvorezinhas de couve-flor no tamanho mais miúdo que ficam sem desmanchar sua forma, as partes mais grossas dos talos foram pro liquidificador
-       onde acrescentei 4 gemas de ovo (de galinhas soltas e felizes, claro!)
Bati bem.
Então, à parte, bati as claras em neve (uso um mixer velhinho, anos 1980, tão fofo, mas pesaaaaado!) e espalhei as arvrinhas de couve-flor sobre os amendoins; sobre elas, bastante cebolinha picada bem fininha, um pouquinho de sal (a couve-flor está sem tempero, né?) e um parcimonioso fio de azeite por cima, só pro sal escorrer, temperando-as.
Agora, o pulo do gato de todo suflê: aos poucos, derrame a massa que está no liquidificador sobre as claras em neve, misture um pouco, sempre de baixo pra cima (e não como se mexesse açúcar no café, pois assim o suflê ficaria menos aerado); acrescente mais da massa, misture um pouco, sempre gentilmente, sempre de baixo pra cima e, de preferência, com uma colherona – como aquelas de servir arroz. Faça a operação sem pressa, com gestos parecidos com os de tai-chi-chuan, até que toda a massa do liquidificador esteja misturada às claras em neve.
Finalmente, só resta despejar essa nova massa (sempre com a gentileza de quem entende o quanto o suflê é sutil) sobre o fundo que está montado na travessa de cerâmica. E, sobre tudo isso, bastante queijo ralado (misturei branco e padrão).

 Ah, o forno já estará quente, a temperatura média (liguei antes de começar a bater as claras). Em cerca de 20 minutos o suflê fica lindo! Com uma cor vibrante, por causa das cenouras.
Use o tempo de forno pra montar uma bela salada. Assim, quando  estiver pronto, é só servir. Todo mundo gosta de ver um suflê sair do forno e chegar à mesa – é um momento quase místico, não é? Aliás, a comida – quem não sabe? – é feita de muito mais coisa do que os ingredientes culinários...

domingo, 20 de dezembro de 2009

ler no domingo

Hoje há sol! Há sol!
A buganville e as ervinhas ficaram até mais de pé! Como tem feito falta o sol, nossa! E hoje ele está aí.
Então, em vez de me demorar dentro da cozinha, vou me sentar ali fora e continuar lendo, devagar, coisinhas variadas, como quem belisca. Isto: vou ficar beliscando leituras com um belo suco de amora. As polpas de fruta são uma coisa ótima de ter no freezer - pra quem não tem um pomar por perto, claro. Dá pra fazer batidas, sucos, molhos...


Pus mel no meu, que hoje estou assim, pra doces.

No mais, indico duas leituras apetitosas que estão disponíveis na rede:

- o "blog do além" do Marquês de Sade, escrito por Vitor Knijnik - boa pedida pra pensar divertidamente sobre o que fizemos em 2009 e sobre o que podemos (devemos?) não fazer (nem a pau!) em 2010. Acho mesmo que tem uns toques muito bons ali!);

- o texto esclarecedor do historiador Bruno Müller - tema espinhoso, de que muita gente foge como o diabo da cruz mas não adianta: pula na cara de todo mundo o tempo todo, mesmo de quem não quer ver - vejamos!

sábado, 19 de dezembro de 2009

ghee - manteiga clarificada

Puxa, semana destrambelhada esta! De certo modo, é um destrambelhamento divertido, porque pode ser ocasião pra uma renovação da rotina.

Os últimos dias foram de muito trabalho em casa, e as refeições foram espalhadas pela rua, casas de amigos, por aí... - houve reuniões de encerramento, confraternizações variadas, a soleníssima reinauguração do Museu da Faculdade de Medicina da USP (que virou um centro de documentação belíssimo!), o concerto de encerramento da OSESP (que teve um ano sofrido, meio órfão da força apaixonada que a regia...) e amigos queridos chegando de alhures, paulistanos que lograram ir morar noutras plagas, onde a vida é mais vivível.

Espantados com a feiúra da cidade, com o odor dos bairros que têm seus esgotos arrebentados pelas chuvas e pela má administração dessa problemática, também com os 30 km/h que são a média de deslocamento no cotidiano..., esses amigos recém-chegados sentam-se na minha cozinha pra contar das saudades que têm daqui e que, no entanto, não podem matar: todas as opções culturais e tudo o mais que se costuma elencar como vantagem desta terra está sucumbindo a um mal-viver, que embrutece e adoece a maioria das pessoas...

Mas as rodas de cerveja na cozinha são feitas também das notícias que esses queridos trazem de onde vêm, muitas delas confortantes e inspiradoras - ainda bem! E tem toda essa ternura simples do encontro entre os que se querem bem e gostam de estar na conversa solta, ouvindo uma boa música, beliscando coisinhas - castanhas, damascos, uvas-passas e outras coisas de que falarei outro dia.

Hoje, conforme prometi dias atrás, fecho com a manteiga clarificada (sem gordura saturada) feita em casa. Pra quem quiser dicas de como produzir a manteiga em grande quantidade para estocar, inclusive usando ervas e outros sabores, vale um pulinho aqui.


manteiga clarificada

Compre uma boa manteiga (eu uso sem sal, porque a manteiga já é saborosa per si e, inclusive, porque você pode acrescentar coisas mais legais, como o gersal ou ervinhas etc.). Ponha o tablete de manteigra numa frigideira em fogo beeem baixinho, bem. Aos poucos, vai começar a sair um espuma branca - a tal da gordura saturada - que você tira com uma boa colher, como aquelas grandonas de servir arroz: você vai tirando essa camada de espuma esbranquiçada que faz bolhinhas na superfície e dispensa (ou guarda pra fazer pastéis de nata e outros quitutes desses natalinos, se quiser). Ponha, depois, num potinho (que pode ter tampa ou não), misture o gersal e outras ervas (ou nada) e geladeira nela. Vai ficar durinha como manteiga, de um amarelo mais forte e um sabor muito agradável. Você pode passar no pão e usar em preparos variados: legumes na manteiga, macarrão, refogados...

É muito mais legal comer essa manteiga do que ir parar nas margarinas, né? Com a margarina, perde-se em sabor e, sinceramente, suspeito de que se perca em nutrientes e tudo o mais. Já experimentou deixar um pote de margarina aberto na lavanderia por semanas? Não aconhece nada, não apodrece, não funga... Esquisito, né?


Bem, e já que manteiga é uma dádiva, reconheçamos quem nos brinda com ela: dê um pulinho no site da WPSA e veja só o que rola - mudar algumas práticas pode mudar muita coisa no mundo! É bom isso de estar ao alcance participar da transformação que nos transcende e, assim, também nos beneficia, né? Vá lá.

Vamos lá!

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

coalhada seca

Uau! Que coisa essa histeria natalina!
Sim, eu sei, é também um tempo cheio de coisas boas, encontros queridos, comidas gostosas, de pensar e falar em fraternidade, em boa vontade... Coisas caras, caríssimas a todo ser de bem. Sim, é verdade. Mas tem também um frenesi comprativo (presentes, comidas específicas, roupas novas, passagens, pacotes de férias...), uma pressa generalizada, um trânsito que não transita, uma quantidade inacreditável de mala direta (se fosse só por email, bastava apagar; é chato, mas vá lá... e aquele monte de papel couché que chega pelos Correios, catálogos de vinhos e cestas?! Que loucura!).
Pois foi enfiada nesse mundo que hoje fiquei "presa" no trabalho e não haverá menu pra compartilhar... Compartilho isto já, porque a vida de quem cozinha tem disto: não conseguir cozinhar algumas vezes e ter de se virar na rua. Eu vou comer num lugar gostosinho aqui perto - se não for sempre, não enjoa e não intoxica (falo em “intoxicação” porque mesmo os bons restaurantes usam muita coisa processada, caldo de carne em tablete, às vezes um azeite nem tão bom... haja sódio, gordura saturada e... esses ingredientes que, se forem consumidos só de vez em quando, não dão problema, não).

E depois importa muito o lugar propriamente, se é agradável, se tem boas mesas e cadeiras, amplidão pro olhar, alguma privacidade em relação às mesas vizinhas ou mesas legais pra compartilhar etc. Comer fora pode ser bem bom se a gente não se esquecer de que é preciso dar-se o tempo de. E que não vale qualquer lugar ou qualquer coisa em quaisquer 5 minutos, de pé num boteco ou numa padaria. Quando isso acontece, é porque se está num dia de emergência total, não é?
Dito isso, vou contar como faço a coalhada seca que prometi ontem. Uma base culinária que uso muitíssimo e que todo mundo curte, mesmo quando faz muxoxo antes de provar - eu nem ligo pra isso mais, aprendi que cada um tem mesmo seu tempo, com o perdão do clichê. É só esperar pra ver: o tempo passa, e a pessoa está lá, fanzoca do que é bom nesta vida e que ela, a princípio, tinha estranhado.

coalhada seca

Um litro de leite (de preferência, dos de garrafa, não de caixinha) e um copo de iogurte (caseiro ou não, dá igual). Eu uso uma panela de pedra sabão, acho que faz diferença, sim. Mas pode ser em qualquer panela mais grossinha, pelo menos de fundo grosso, como aquelas boas de fazer risoto.

O leite vai quase todo nessa panela, só uns dois dedinhos são vertidos num pote, onde vai ser misturado com o iogurte. Em fogo baixo, o leite deve esquentar sem ferver - se ferver, já era, tem que usar como leite mesmo. A temperatura a que deve chegar é o quentume pra uma mamadeira, por exemplo: a pele aguenta bem, não queima, sabe?

Enquanto o leite vai esquentando e vc mistura o iogurte lá no pote, acenda o forno vazio.

Estando o leite quente, desligue fogo e forno, jogue o iogurte do pote na panela, mexa vagarosamente e ponha a panela com tampa dentro do forno quente, apagado. Ela deve estar semi-aberta (é muito importante que fique com uma boa abertura pros microrganismos fazerem direito seu trabalho).

Dependendo do dia - se frio ou quente, úmido ou seco etc. -, a operação vai durar 12, 15 ou até 24 horas (isso mesmo, de um dia pro outro). Como é que você vai saber se está pronto? O soro terá se “despregado” da “massa láctea”. Aí, com uma concha, é pôr esse conteúdo no coador de pano (daqueles que têm o suporte pra ficar de pé), com um recipiente embaixo, pra deixar o soro escoar todo. Nesse escoamento, você vai vendo se quer a coalhada mais sequinha, mais molinha - é ir observando. Em geral, depois de 4 horas está no ponto pasta, uma delícia pra passar no pão, em qualquer pão!

Importante: guarde no pote onde você vai misturar com azeite e sal (pouco sal, é só um elan) mexendo bastante mesmo, vigorosamente, e em cuja tampa vai fazer uns furinhos, muitos, distribuídos em toda a tampa: assim a coalhada dura mais de 10 dias na geladeira, não mofa. Se acontecer de começar a ficar rosada, dispense; não vale a pena se arriscar. Só que eu duvi-d-ó-dó que ela vai demorar tudo isso na geladeira... Mesmo na geladeira de quem mora sozinho!

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

De onde vem o que você come?


Hoje fomos de repeteco do menu de ontem.

Só a salada é outra, a de ontem já era! Hoje foram tomates sem semente picados em cubos grandes e recheados de coalhada seca. Dia destes conto como faço a coalhada e também a manteiga clarificada – que são coisas bem gostosas de passar no pão e usar noutros preparos.

Pra já, queria explicar por que veio tanto espinafre na semana passada. É que compro alimentos (verduras, legumes, frutas e pães) orgânicos certificados, produzidos e distribuídos por uma rede chamada Sementes de Paz. No meu caso, participo como associada de um núcleo que faz parte da logística de distribuição da rede, a Morada da Floresta.

Com isso, como o que vem nas cestas, conforme a época do ano, as condições de plantio e a organização de pessoas que são as mais importantes nisso tudo: as famílias e as cooperativas que se organizam pra produzir coisas saudáveis, que não vão ficar viajando mil anos e passando por mil mãos diferentes etc. até chegarem aqui.

Esses gestos dos que semeiam e colhem pra depois mandar pra gente preparar e comer, eu considero que são os primeiros de todos os gestos que farão parte daquilo que vai habitar meu corpo e também os corpos de que vem a minha cozinha.

Não é uma boa sorte danada comer assim?!
Amém!

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

batatas ao forno e lentilha com laranja



Ah, a segunda-feira! Por aqui é puro agito: tem mais gente pro almoço, e acaba sendo o dia em que aproveito pra fazer coisas que sobrem (sobretudo arroz, feijão...) ou que possam ir virando outras coisas no correr dos dias.

Como eu dizia, tem uma economia do gesto na cozinha.

Não só na hora de fazer os pratos. Se o negócio é incorporar uma certa produção no dia a dia, importa muito quantos potinhos você vai sujar, quantas colheres e raladores e eletrodomésticos... Importa muito, por isso, ter os utensílios à mão e que sejam resistentes e bonitos, pois assim servem pras etapas intermediárias (tamanho, material, resistência a calor, frio, etc.) e também pra ir à mesa – menos louça pra lavar, menos perda de alimento.

O fato é que hoje eu tinha que cozinhar umas batatas de qualquer jeito. Batatas não podem se demorar na despensa, né? Então fiz batatas ao forno. Pra acompanhar, lentilha com suco de laranja e salada de espinafre (sim, eu sei... na semana passada veio muito espinafre!) com mostarda e grãos de soja.

Fiz um arroz básico também, força do hábito, porque em termos de nutrientes e de gostosura, sem o arroz já dá uma bela refeição.

as batatas
Cozinhei-as no vapor até que um garfo, exigindo alguma ênfase, entrasse nelas (é importante não cozinhar demais os legumes, eles perdem propriedades). Daí, numa travessa refratária (acho tão engraçado pensar que a minha velha e boa travessa, singela, transparente e acolhedora, seja “refratária”...), piquei rodelinhas bem finas de cenoura e rodelinhas bem finas de alho poró – usei um alho poró dos grandes, inteiro. Uma parte em rodelinhas, pro fundo da travessa, outra parte em quadradinhos bem fininhos – isso é importante! De novo, faz diferença o gesto: como se pica, como se monta...

Feita essa camada de base (cenouras e alho poró em rodelas), distribuí as batatas cortadas em 4 ou 6 pedaços mais ou menos do mesmo tamanho – com casca e tudo, que é nutritiva e estava lavadíssima. Pus umas pitadas de sal, assim por cima, derramei ao longo das batatas o alho poró em quadradinhos pequenos, um fiiiiio de azeite em cima de tudo.

O forno já estava quente e, em temperatura média, deixei as batatinhas lá por 15 minutos; daí, abri o forno, forrei a parte superior com queijo branco (um bom queijo branco, claro, nada com gosto de ricota insossa). Mais 5 ou 10 minutos. Aí, é regar com azeite ou outros temperos líquidos e boa! Batata não tem erro.

a lentilha
Para 500 gramas de lentilha, 1 litro de água; para 250, meio litro. O mais é sempre igual: suco de duas laranjas + uma laranja inteira superbem lavada, 3 cravos, 2 dentes de alho e uma cebola refogados anteriormente, 2 folhas de louro, pimenta do reino moída na hora, sal.

Primeiro vão a laranja partida ao meio e os cravos espetados na casca dela, a lentilha, a água e as folhas de louro – cozinhe em fogo baixo por uns 15 minutos, panela semi-tampada.

Depois acrescente, nesta ordem: alho e cebola refogados, mexa, pimenta do reino e sal, mexa. Acrescente, então, o suco de laranja. Em 10 minutos (de panela semi-tampada), a lentilha deve estar macia, sem desmanchar.

o espinafre e a mostarda
Sabe aquelas folhinhas que ainda estão boas mas já não estão viçosas? Mandei ver no processador: as de espinafre e as de mostarda. Aí misturei aquele verdinho todo repicado com azeite e mostarda tipo dijon (com sementinhas) e grãos de soja partida – são crocantes e vêm temperados com ervas finas (compra-se pronto, é um coringão no setor das saladas).

domingo, 13 de dezembro de 2009

tomate, hortelã e mussarela de búfala

Hoje vou almoçar fora, acho. Ou nem vou almoçar...

Amanheceu um domingo chocho, uma preguicinha bateu, a única coisa que quero fazer hoje é ler… E calhou que minha madrinha, que morou mil anos no Rio de Janeiro pilotando un restaurant très chic, me mandou uma receita na medida pros dias pós-orgias gastronômicas – como sói acontecer com os sábados, os de alegria e os de deprezinha (não raro, come-se um bocado mais, ou coisas mais pesadas, frituras, sorvetes, beliscos…). Já sabemos que há alegrias vorazes, e também que há depressões glutonas. Então, eis uma sopa de tomate que lembra o gaspacho, mas é um tico mais leve e é um, digamos, “limpador” do organismo.

Se quiser pôr uma substanciazinha a mais, sobretudo pras crianças, ofereça pães variados, fica bonito e é divertido escolher qual pedacinho de pão vai ser embebido no creme saboroso e cheio de nuances de cor.

ingredientes

1 xícara de suco de tomate
1/4 xícara de azeite
1 kg de tomates bem maduros (parta em 4 e tire só as sementes)
1/4 de xícara de folhas de hortelã
2 pepinos pequenos sem casca e sem sementes
1 cebola média
sal e pimenta quanto baste
1 maço de endro ou dill
2 bolas de mussarela de búfala (corte em cubos pequenos)

preparação

1) bata no liquidificador o tomate, o pepino, suco de tomate, a cebola, a hortelã e o azeite
2) tempere com sal e pimenta
3) passe na peneira e leve à geladeira
4) depois de gelada, acrescente os cubos de mussarela e o dill


Com um bom suco de fruta natural, a refeição ficará completa. Bom apetite!

Eu tô indo pra rede com um livro; nada sério, só uma companhia despretensiosa, pra ver o tempo passar...

sábado, 12 de dezembro de 2009

iogurte com mostarda e creme de melão



Ontem amigos vieram desperdir-se: vão pra Bogotá, passar natal e ano novo com parentes e amigos de lá. O encontro tinha, então, uma cara de “festas de fim de ano”.
Gosto muitíssimo disto que é um período de semanas (antes do natal) em que as pessoas se encontram pra falar de como foi, de como será: balanços, lembranças, esperanças, planos... Tudo isso regado a boa cachaça, envelhecida no carvalho, fica com uma cara de ritual de passagem. Um fraterno ritual. Um vero ritual.

Mas, como eu dizia no outro post, o dia ontem foi corrido, e quando os amigos chegaram, o que pôde acompanhar a boa (e forte!) cachaça foram amêndoas (sempre elas, uma espécie de default dos petiscos domésticos) e filetes de pão sueco pra mergulhar no iogurte com mostarda. Fica muito bom! Pra acompanhar cerveja também, e uísque, e vodca...

Iogurte com mostarda: um copinho de iogurte natural consistência firme; duas fartas colheres de sopa de mostarda (com ou sem sementinhas, com ou sem pimenta, dá pra variar); um fio de azeite extravirgem. Aí é só mexer um pouco – não muito, nem rápido, porque isso faria o iogurte perder consistência. Os gestos, na cozinha, fazem toda a diferença!

Daí saímos, rimos, e tudo teria sido perfeito não fosse uma das pessoas, com raivas amordaçadas, destemperar-se com outra, criando aquele constrangimento típico de uma intimidade mal resolvida posta na roda errada... Ai, poucas coisas me deixam tão sem rumo quanto pito público de marido! É tão grosseiro, tão desrespeitoso... Mas vá lá que a vida tem disso, e os destemperos hão de se acertar.

Ainda bem que um dos convivas soube, depois do inevitável silêncio atônito de todos, perguntar da cerveja, se ainda tinha, e era uma Nortenha, deu assunto sobre o Uruguai, e tudo ficou simpático de novo.

Dormimos tarde, acordamos tarde, e o almoço vai sair sabe deus a que horas.

Por isso, deixo hoje o registro de uma iguaria que fiz pela primeira vez ontem, e que serve tanto de aperitivo quanto de sobremesa (pra nós, ontem, foi pós-café, como um digestivo, quando voltamos pra casa): creme de melão. Tem que ser melão pele de sapo (aqueles verdes, que têm mais massa/menos água do que os amarelos).

Creme de melão: é pôr no liquidificador um melão pele de sapo (pode-se cortar bem rente à casca, aproveitando-se o máximo da polpa); um tico de mel (pouco, a ideia não é ficar doce-doce, só adocicado) – bater um pouco, só pra desfazer os pedaços. Se o liquidificador for daqueles que exige líquido pra começar a bater, põe-se pouquíssima água no fundo, só pra ajudar a hélice.

À parte, derretem-se dois pacotinhos-padrão de gelatina incolor (nem sei se precisava dizer, mas... a “gelatina” de que falo é agar-agar, que é muito mais saudável do que produtos de origem animal, que provêm daquele sofrimento todo que a gente já sabe como é... credo!). Importante: é preciso usar quase o dobro da quantidade de água sugerida para a dissolução, pois a ideia é ficar cremoso e não durinho – como era o caso da mousse de manjericão de que falei outro dia.

Por fim, o toque sensacional: num gesto lento, fazendo um círculo em sentido horário, verte-se uma parcimoniosa quantidade de água de laranjeira sobre o creme. É um aroma que ressalta as qualidades do melão. Antenção: não pode ser o aroma-solo, ele vem pra ser o espírito do prato. Mexe-se suavemente, só pra misturar os ingredientes, e serão pelo menos 2 horas de geladeira pra chegar à textura mais gostosa.

Nos dias quentes, servir em potinhos antes da refeição é legal: abre o apetite.
Nos dias quentes, servir em potinhos depois da refeição é legal: ajuda na digestão.
Versão “hard”: com sorvete de creme fica uma loucura!

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

bolinhos num dia corrido...



... porque têm sido assim os dias das pessoas todas. Se forem perguntadas sobre a razão de tanta correria, saem enumerando afazeres que sempre vêm com cara de coisas sérias, importantes, impostergáveis, imprescindíveis.

Duvido um pouco disso. Dessa lista de importâncias sem hierarquia, que soa tão inquestionável. Frequentemente troco essa resignação da lista de afazeres por uma indignação. Claro que dá trabalho ficar indignada e, então, tentar mudar isso, me mexer de um jeito que não seja essa “óbvia” participação no “mundo de hoje”. Mas não creio, pelo que vejo à volta, que dá menos trabalho resignar-se.

Repetir mantricamente as razões da correria não alivia, não explica nada, não dá sentido à vida, só uma autorização pessoal e social pra continuar correndo. Esquisito. Eu acho esquisito.

Bem, mas meu dia está corrido, e não vou enumerar razões. Vou só contar o que deu pra fazer em uma hora.

Na primeira meia hora, peguei todos os legumes e folhas que vieram sobrando em potinhos na geladeira, inclusive o arroz, bati com ovos no liquidificador.

Primeiro bati um pouco as sobras, vi que chegava ali pela metade do copo do liquidificador, experimentei, achei que dava pra acrescentar uma pitada de sal e uma cebola (vamos assar bolinhos, e a cebola aromatiza tudo deliciosamente quando vai ao forno) e acrescentei, então, 2 ovos. Bati na velocidade 5 do meu aparelho novo, que bate até bolo. Minha mãe me deu esse superliquidificador de aniversário. Chique!

Daí fiz bolinhas dessa massa de legumes e verduras na palma da mão, passei as bolinhas num prato com farinha de milho flocada, depois num outro prato com mais 2 ovos batidos à mão, depois na farinha de milho de novo.

Ajeitei as bolinhas numa assadeira – forno médio, de 15 a 20 minutos.

Enquanto as bolinhas assavam, fiz um arroz novo. Um arroz preto.

E piquei um pouco de alface americana, que juntei com cubinhos de tomate sem semente e sementes de girassol cruas. Azeite, limão e tomilho (em pó) ficaram num potinho à parte, pra quem quiser temperar a salada.

Já está. A outra meia hora foi comer as bolinhas que viraram bolinhos (regar com um fio de azeite extravirgem logo que sai do forno fica bem gostoso), arroz preto e salada.

Agora é fazer um café, olhar os emails e seguir trabalhando até as 19h, quando começo a me arrumar pro festejo à noite: é fim de ano, e começa um trancetê danado de gente que sai em viagem, gente que chega de viagem, e a cozinha vai ficar cheia dessa gente contando como foi 2009 – alguns, parece, têm reclamado (mas ainda não entendi muito bem de quê), outros têm, apesar da correria, achado que há motivos pra celebração, pelo menos aqui no Brasil, onde a vida de muita, muita gente andou melhorando um bocado. Eu estou na turma que quer fazer o brinde: tim-tim!

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

pasteizinhos de abóbora


Tem gente que não gosta de abóbora… Vê se pode?!

Hoje fizemos pasteizinhos assados de jerimum e vagem, arroz basiquinho, feijão carioca com pouco sal e louro, mais uma salada de folhas, beterraba, cenoura e nozes.

Foi assim: antes de mais nada, é pôr o arroz pra cozer e o feijão também (este dá pra fazer em boa quantidade e guardar em potinhos no freezer, sem temperar; assim você vai usando a quantidade necessária em cada refeição).

Eu estava nessa altura quando uma amiga chegou, vinha deixar um documento e resolveu ficar, então decidimos encarar a abóbora: partir jerimum é obra pra dois ou pra quem está com tempo e vontade, porque é uma casca peremptória! Aliás, há receitas ótimas, bem práticas, que usam a casca como recipiente – mas isso ficou pra outro dia.

Hoje cozemos na panela de barro (daquelas capixabas de fazer moqueca) o jerimum descascado em cubos, um pouquinho só de água no fundo, bem pouquinho mesmo – porque ele solta água e porque queremos um creme mais pra consistente. Alho (dois dentes médios esmagadinhos), pimenta calabresa (pitadinhas), sal (meia colherinha de chá), um tantinho bem tantinho de gengibre ralado.

Aos poucos, acrescente a vagem, pouca quantidade e picada em rodelitas miúdas.

Quando tudo isso estiver cremoso, desligue o fogo, acrescente um fio de azeite, mexa, acrescente uns 50 gramas mais ou menos de queijo ralado (branco, padrão ou meia-cura – ah, regule o sal de acordo com o tipo de queijo que usar). Use massa de pastel para fritar ou assar – queremos assar. Eu tive a sorte de conhecer essa massa para assar este ano, um casal queridíssimo me apresentou. Fizemos juntos pastéis salgados e doces. Simples e divino. Os de banana ou de maçã pra acompanhar um cafezinho... Nossa!

Creme feito, preencha as rodelas de massa – em geral é fininha, delicada – com uma quantidade do creme que não estufe o pastelzinho: molhe as bordas da massa para selá-la (se quiser, use um garfo pra fazer um barrado desenhadinho; essa é uma tarefa que as crianças a-do-ram!). Distribua os pastéis numa assadeira com distância razoável pra eles não grudarem (eles não vão crescer). Em 15 minutos de forno médio estarão apetitosos. Se gostar de pastel “dourado”, pincele os caras com uma gema de ovo – mas se for jogar fora a clara, bem... Gosto deles branquicelinhos, sabia?

Enquanto isso, peguei as folhas de espinafre que sobraram da segunda-feira, piquei (rasgando com a mão) umas folhas de alface americana, folhas de agrião e de manjericão, juntei com uma beterraba ralada e umas cenourinhas raladas também; por fim, as nozes esmigalhadas com a mão mesmo. Daí é só revolver até ficar tudo bem com cara de sortido – os temperos ficam na mesa pra quem quiser: assim a sobra não fica murcha e dá pra guardar pra um sanduíche à noite. Nada mal!

Tomamos café longamente, porque é bom demais ficar sentindo aquele aroma numa conversinha sobre nada, prazer pequenino do descompromisso geral por uns minutos. Faz bem à digestão, né?

Lavamos a louça juntas – era pouca. E separei dois melões “pele de sapo” pra fazer uma gelatina daqui a pouco. Hummm...

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

massinha básica pra quem está triste




Hoje estou tristíssima, e não é bom cozinhar assim.

Abandonaram, mais uma vez, oh céus!, um cão velhinho. É muito, muito, muito complicado julgar desconhecendo as razões de quem fez isso, eu sei... Mas, pela frequência com que isso acontece e pelas estratégias que já vi sendo postas em curso, dá pra registrar, sem risco de ser injusta, a perplexidade diante do mal que temos sido capazes de infligir aos bichos.

Nem vou começar a falar em granjas ou em galos de briga.

Ovos, só caipira, os das galinhas felizes – que são menores, de cores mais vivas e dão melhor liga nos suflês, por exemplo. Quanto às rinhas... as dos galos, as dos pitbulls e toda a loucura de querer ver sangue, é tudo muito parecido com esse desprezo do abandono... Um horror supremo. Uma inacreditável falta de humanidade. E o agravamento de problemas de saúde pública nas grandes cidades etc. etc. Um horror!

Quando a gente está assim, com esse tipo de tristeza – que é uma profunda dificuldade de acreditar no quanto somos capazes de violar a vida, nós, os humanos –, é melhor não fazer nenhum prato novo, ou seja, o negócio é requentar, no máximo dar uma incrementada no que já está na geladeira, vindo de outros dias, os pedacinhos de refeições anteriores. Tirar dos potinhos plásticos e colocar em tigelas bonitas já dá uma carinha bem boa pro “soborô”, como se diz.

Se não tiver nada na geladeira, você dá conta de produzir uma refeição com uma boa massa pronta, um molhinho de tomate orgânico bem curtido em fogo baixo (acrescentando um copo de água e deixando ali por meia hora, com uma mexida ou outra de vez em quando, panela destampada), um bom queijo ralado (o branco, o padrão ou o meia-cura ficam uma delícia), mais umas folhinhas de rúcula ou agrião salpicadas nos pratos, por cima ou em volta da massa.

Se tiver um tomatinho cereja, então, é só cortar em metades e fazer um círculo em cada prato, regar com azeite extravirgem e pronto!

Se a ideia for evitar farinha de trigo branca, há massas secas de farinha integral muito boas e, para além desse universo clássico, há massas secas feitas de farinha de arroz, de farro ou de milho – uma mais gostosa que a outra! Vale a pena ter na despensa.

No fim das contas, pra dar um toque, acabei picando também em metadinhas umas amêndoas. Amêndoa é uma coisa santa! Acrescente-as sempre no final da receita, pra ficarem crocantes e preservarem seus melhores nutrientes. Neste caso (de uma massinha rápida), misture-as à massa só no final, antes de jogar o molho por cima de tudo.

Na verdade, é bom que se diga: quando bate assim uma tristeza destas (porque há outras tristezas, né?), o melhor é comer coisas mais quentinhas, cozidas, consoladoras. O que é cru e frio pode exigir demais de quem está com o coração em frangalhos.

Bem, vou afagar os bichos aqui de casa e acender uma vela pro cãozinho; haverá luz na trilha dele, haverá quem tenha um quintal que possa recebê-lo. Já sabemos onde está a força que pode vencer o desamparo e o abandono: adotar é tudo de bom!

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Sai um almoço rapidinho!


Hoje o dia está esquisito, e o horário apertado.
É que não para de chover desde a meia noite! Julho foi assim, também agosto e setembro, em outubro houve algum sol, mas havia também chuva, muita chuva, e novembro idem. Algumas coisas da horta não aguentaram... Só a cânfora e a lavanda gostaram pra valer.

Esta noite foi assim: acordei várias vezes, numa delas encontrei os gatos no meio do corredor, eles também injuriados com tanta choveção cinza. Ficamos um tempo em roda, miando uns pros outros solidários. Até que, num acordo tácito, cada um foi prum cantinho encavernar e dormir.

Eu ainda fui lá fora, não sei na esperança de quê.

Acabou que acordei tarde, tudo ficou meio atrasado, e o almoço teve que sair num passe de mágica. Lá vai o menu que deu: arroz com rodelinhas de cenoura; abobrinha no forno; salada de espinafre, alface e beterraba com molho de mostarda.

Arroz
Parboilizado, integral, 7 grãos... qualquer um deles cozido com rodelinhas de cenoura.

Abobrinha em camadas
- rale nos buraquinhos mais grossos uma abobrinha inteira (duas se forem da italiana mais miúda), reserve
- amasse (bem amassados!) uns 100 gramas de ricota com 2 dentes de alho, cebolinha bem picada, uma pimentinha de cheiro e azeite (generosamente)
- pique cebola em quadraditos pequenos e/ou alho poró
- rale uns 150 gramas de queijo tipo padrão (ele derrete, mas não é pesadão como queijos mais amarelos; pode ser destes, se a ideia for comer algo de sabor mais forte).

Distribua uma parte da abobrinha ralada no fundo de um pirex que pode ir ao forno. Em cima dessa camada, ponha um pouco da cebola ou alho poró; daí uma camadona com toda a ricota; por cima dela, o restante da abobrinha ralada; por cima dela, mais um pouco da cebola ou alho poró; daí o queijo ralado por toda a superfície. Regue com um fiozinho sutil de azeite.

20 minutos de forno médio devem bastar. A abobrinha solta bastante água (sobretudo se estiver com as sementes) e cozinha logo. Retire quando o queijo de cima começar a ficar uma “casquinha”. Fica com cara de torta. Parte-se em pedaços quadrados na hora de servir.

Salada de espinafre
- pique com as mãos um monte de folhas de espinafre (sem os cabinhos, que vc pode guardar pra fazer outra coisa depois)
- rale uma ou duas beterrabas (com casca, se for orgânica)
- pique, com a mão mesmo, folhas de alface (qualquer tipo ou vários ao mesmo tempo – o que é uma delícia!)
- use mostarda do tipo dijon: ponha duas colheres de sopa num pote, acrescente um tico de vinagre balsâmico ou suco de um limão, rale só um pouco da casquinha do limão, e mande ver no azeite. Mexa bem, mexa bem.

A louça ficou pra depois, tenho de ir correndo pro trabalho, que hoje é fora.
Acho até que está estiando... Talvez dê pra ir a pé. Que bom!

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

mousse de manjericão


Hoje fiz uma mousse de manjericão.

No liquidificador:
- um bom punhado de alfavaca (o manjericão de folha bem verdinha e grande)
- um dente de alho médio
- pimenta branca moída na hora (se der...)
- 1 copinho de iogurte natural (consistência firme é mais legal)
- uns 50 gramas ou pouco mais de queijo meia-cura (ou o que estiver ao alcance)
- pitadica de sal (bem parcimoniosa, bem!)
- um fiozão generoso de azeite (extra virgem é a melhor pedida)

bate-bate-bate - 1 minuto direto.

No fogão, enquanto tudo bate, derreta (pode deixar ferver) dois pacotinhos-padrão de gelatina incolor (agar-agar).

Numa forma de pudim ou outra bonitinha, despeje a massa de manjericão (não precisa untar, nada disso) e, depois, derrame aos poucos a gelatina morna, misture bem, em círculos miúdos sempre no sentido horário.

3 horas de geladeira.

Na hora de servir, desenforme num prato de cor clara (o contraste fica superbonito), salpique cebolinha ou alho poró cortados bem miudinhos, bem miudinhos mesmo, e jogue um fio daquele azeite bom no topo, pra ele escorrer pelas laterais embebendo a cebolinha.

Fica lindo no meio das saladas e é uma delícia comer com arroz 7 grãos - derrete devagar...

Manjericão é uma dessas presenças fortes que se fazem de leveza e enlevo, não é?
Conheço pessoas-manjericão: nunca passam despercebidas, mas sempre são identificadas com frescor, simpatia, suavidade.

domingo, 6 de dezembro de 2009

A cozinha é um lugar de partilha



Acabo de lavar a louça de um almoço por acaso, com um amigo que veio nos ver.
Fizemos um risoto de espinafre. Um espinafre tenro, fresco, ótimo.
Bebemos cerveja escura.
Os truques que fizeram a coisa toda virar iguaria foram: suco de laranja, um pouco de noz-moscada (ralada na hora) e uma pimentinha de cheiro antes de pôr a manteiga.
Sobremesa: “torta” de banana e iogurte.
Café.

A torta é fácil, é só picar e forno. Depois vem o iogurte com mel e canela, geladeira.
Mas o risoto é exigente: tem que mexer constantemente, acompanhar a textura, a umidade, ir concha a concha.

Agora é estender a roupa no varal e desejar alguma coisa boa pro futuro.
Quem sabe um joguinho de cartas?