sábado, 27 de fevereiro de 2010

farofa sem farinha


Não é que a gente deva abolir de vez as farinhas, nada disso, são ligas importantes e muitas são mesmo nutritivas e bem gostosas, mas a gente não deve basear a alimentação inteiramente em uma delas. Pão de farinha de mandioca ou de milho são tão gostosos, né? E pão feito com inhame? Uma amiga ficou de me ensinar, diz que é simplesmente maravilhoso. Mas o tal do pãozinho-de-todo-dia e as massas mais difundidas são de trigo, em geral bem processado...

Em todo caso, acho que cortar totalmente alguma farinha só se for por alguma restrição alérgica (é, eu sei... muita gente tem muitas alergias hoje, neste mundo dos agrotóxicos, dos fármacos consumidos sem restrições, do excesso de assepsia que deixa as crianças com baixa defesa natural, esse monte de produtos de limpeza à base de petroquímicos...).
A farofa em questão serve, então, pra alguns alérgicos, mas soube que contém glúten – atenção!

Veja só que delicinha.

Comece pondo dois ovos pra cozer. Ovos caipiras, de galinhas felizes (não faz sentido comer ovo de galinha que sofre, né? Se não por outro motivo, porque é lógico que nos fará sofrer também, é uma questão de tempo).

Numa frigideira untada (não regada) com bom óleo, refoga-se a cebola em pedaços médios (não miudinhos); quando estiverem começando a dourar, acrescenta-se um dente de alho esmagado; é o tempo de o alho “fritar” um tiquinho, e asperge-se, aos poucos, a aveia em flocos (uma xícara de chá mais ou menos), mistura-se bem, pacientemente, sempre em fogo médio, até a aveia escurecer um pouco; daí acrescentam-se: flocos de milho, uma boa mexida, rodelinhas de cebolinha beeem fininhas, alho poró em tirinhas beeem fininhas, sal. Mexe-se pra lá, pra cá, cantarola-se uma música animada (farofa é coisa animada, certo?) e desliga-se a frigideira.

Aí vão entrar os ovos cozidos, cortados em tirinhas ou quadradinhos; naqueles cortadores de ovo fica ótimo: saem quadradinhos legais. Mistura-se tudo, acrescentam-se umas gotinhas de pimenta caseira, mais uma mexida, e pronto.

Com um arroz básico, um feijão preto ou carioca e pedaços de moranga, nossa, não tem pra ninguém! Mas eu gosto de oferecer também alguma folha crua, alface, por exemplo, que é bem aguadinha, e uns rabanetes em rodelas finas.

Ah, dependendo dos acompanhamentos, cai muito bem misturar castanha-do-pará ou de caju esmigallhada.

A propósito dessa mistura de aveia com castanhas, vou contar, depois, como fazer uma deliciosa cuca que não usa farinha também. Fiz ontem, hummm... Estou indo comer um pedaço já, já.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

chá no calor


Uau, fiquei muitos dias longe da minha cozinha: trabalho alhures, bastante! E que sensação gozada tem isso, um certo compasso de espera, uma pausa longa aguardando o ataque da nota que sabidamente virá – mas não chega; é como se estivesse esperando uma pessoa querida que se atrasa sem notícias...

Enfim, de volta, quero falar do que aprendi nessas andanças por aí. Banal e utilíssimo: hidratar-se sempre. Estive em lugares quentíssimos, íssimos. E sei que por aqui tudo andou também bem quente e ressecativo, até perdi minha capuchinha e boa parte de minha melissa, porque não houve quem desse conta das tadinhas, que sucumbiram aos seguidos dias de alta temperatura e, segundo se disse na grande mídia, dias que incluíram um recorde de radiação solar, parece...

O fato é que hidratar-se não significa se encher de água. Tomar um monte de água (e aí conta também que água é essa, né?) pode significar apenas lavar-se por dentro, digamos, inclusive perdendo alguns sais e outros elementos que fariam melhor se ficassem mais no corpo. A alimentação ayurvédica fala bastante nisso.

Só que muitas avós também falavam, e ainda os budistas chineses desde há muito, e as culturas árabes que estão intimamente ligadas a climas desérticos. Detalhe: manter-se hidratado, em todos esses casos, também supõe cuidar da moleira, essa “abertura” que os bebês têm na parte superior da caixa craniana. Por isso chapéus, turbantes, sombrinhas... É uma loucura a gente se expor tão desabridamente a certas quantidades de sol e calor.

Outra coisa: o sono. Faz parte de manter-se hidratado dormir direito e, ao acordar, consumir algum líquido, um pouco de água ou suco (de preferência ao natural, não gelado), porque a atividade noturna também exige de nosso metabolismo. Dependendo do que comemos no dia anterior, então!

Pois vem de longa data e de muitos lugares e povos o hábito que encontrei na casa de uma amiga, que a vida toda fez isto: chá gelado. Mas o barato é fazer de monte e deixar gelando. Não dá pra fazer um chá na hora da vontade e esperar que todo o processo aconteça, certo?

Estou reutilizando garrafas de suco de uva, que são de litro e meio e vêm com uma boa tampa de rosca. Faço um panelão de chá, deixo esfriar, coo, engarrafo, e geladeira nele. E todo mundo fica tão feliz quando abre a geladeira e lá está o tal do chá: tinindo de refrescante!

É isso mesmo, simplinho demais.
Porém, quatro observações me parecem cruciais:

1-    nunca deixar as folhas do chá cozendo na água fervente (tipo: fui fazer outra coisa e esqueci – perdem-se muitos valores e teores nesse esquecimento); depois que a água ferver, ou mesmo antes, quando estiver quentíssima mas ainda sem borbulhar, desliga-se o fogo e deixa-se que as folhinhas descansem sobre a água, panela semi-tampada ou com um paninho bem fino abafando;
2-    é preciso coar ou filtrar: as folhinhas e capins têm microestruturas que podem se alojar em mucosas, por exemplo, causando problemas futuros: usar um coador de pano é simples e barato;
3-    pode-se usar chá de saquinho, claro, alguns são excelentes (como os da Weleda, por exemplo), mas acho que o grande lance é usar aquelas folhinhas que você secou porque ganhou de alguém, porque foi ao mercadão comprar e trouxe grande quantidade, ou que moram ali no quintal. Nada se compara a esse frescor dos alimentos in natura;
4-    é preciso variar o sabor do chá: não só porque é mais gostosinho e ninguém enjoa (ainda mais a criançada, que às vezes se sai com essa, de enjoar da mesma coisa “toda hora”...), é que, além de ser boa a surpresa de cada aroma ao longo da semana quente, tomar demais de um mesmo tipo de chá pode ser descompensador, desbalanceador: muito das mesmas substâncias no organismo... Lembremos que a variedade é tudo de bom! São os fractais que fazem o uno, não é? Ou, se se preferir, o uno é feito de fractais.
 
Os meus favoritos: chá mate (com ou sem limão), chá de limão, de laranja ou de maçã (feitos com as cascas das frutas), chá de canela (com cravo ou noz moscada ralada), erva-doce, erva cidreira, hortelã. Mas isso é só o meu primeiro time. O mundo dos chás é vastíssimo, e conhecer um pouco das ervas antes de usá-las pode ser o segredo do sucesso. Tim-tim!

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

molho de laranja


Estou longe da minha cozinha estes dias, mas, por causa da sugestão que dei pra acompanhar os palitos de gengibre que aprendi com a Luciana de outra cozinha, ela acabou me escrevendo: quer saber que molho de laranja é esse que eu sugeria como alternativa ao shoyo.

Pois eu vou contar qual é a do molho, mas duas coisas devem ser ditas antes: 1. adoro shoyo e acho que, sem abuso, ele é um ingrediente precioso no dia a dia, pra muito além de “pratos orientais”; 2. há molhos de laranja famosíssimos por aí, o meu é uma coisinha mais simples, coisa de aproveitar lá e cá os legumes inteiros, as cascas, o que tem na geladeira, ou seja, coisa da “cozinha verdade” ou, como diz o Paulo de Oliveira, do Larica Total, da “verdadeira culinária de guerrilha” (trabalhando com o que tem na geladeira, com os utensílios disponíveis e com o tempo que nos é possível).

Então, é o seguinte:

o básico

- uma bela cebola cortada em filetes fininhos

- um bom azeite de oliva (não extravirgem, porque vamos cozinhar bastante tempo, então é melhor usar daqueles azeites próprios para essas temperaturas mais altas)

- meio litro de suco de laranja, ou mais, à vontade

- as cascas das laranjas raladas (raspadas, na verdade)

- dois tomates sem pele (se der) e sem semente (necessariamente)

- uma colheirinha de café de sal (que a gente só acrescenta lá pro fim, certo?)

Refogam-se os filetinhos de cebola até dourarem ligeiramente, acrescentam-se o suco de laranja, as raspas e o que vai dar corpo ao molho.

E o que vai dar corpo ao molho?

Há ingredientes clássicos: maizena (e aí a quantidade é um teste, porque tem que cuidar de não empelotar, etc.); creme de leite (que pode ser do fresco, 100 gramas, mais ou menos); sagu (que eu acho delicioso, mas nem todo mundo aprecia essa textura tão específica).

Há os truques bacanas: cenouras processadas (ou raladas e cozidas até perderem a forma, até virarem um creme denso – no processador, preservam-se nutrientes); miolo de abobrinha (este eu acho que é o encorpador campeão, pega gosto de tudo que se põe junto, basta amassar bem com um garfo, cru mesmo, e pôr na receita – sempre que faço canoas de abobrinha, guardo o miolo na geladeira pra essa função); e farinha de aveia (farinha mesmo, não flocos).

Há quem ponha licor de laranja em vez das raspas.
Há quem ponha também um pouco de vinho branco. Fica divino.

Tudo isso numa panela de fundo mais grosso vai cozinhar em fogo brando brando, até o molho reduzir quase à metade do volume inicial. Mexe-se de vez em quando, pra não pegar no fundo. Se se quiser garantir um molho sem pedacinho de nada, pode-se coar numa peneira grande, no final. Eu não coo, porque fica tudo muito cozidinho, quase homogêneo, acho gostoso.

Facinho, né? Se não se usar creme de leite e maizena, ele dura até uns quatro ou cinco dias na geladeira. Às vezes rego as saladas, ou um arroz sete grãos. Vê se não fica bom isso!? Só pode.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

petisco de rabanete


Este post ia se chamar “fruta no pé”, porque estou chegando de duas visitas que fizemos, visitas prazenteiras. Eu diria que estivemos em dois dos quintais mais gostosos que conheço. Uma boa sorte danada!

Uma das visitas foi a um casal que é bom de papo toda vida, daqueles que gostam de ir emendando uma conversa na outra, sem fim e sem tempo... Não precisava nem dizer que é gente que gosta de oferecer mesa farta: quem aprecia a conversa solta, conversa que vai e que vem, entregue na tarde quente, gosta de comer aos poucos, ir experimentando cada legume que há na mesa, cada tempero, cada mistura... e tudo é assunto que rende.

Pois esse casal, que veio do sul há tempos, tem uma bela casa rodeada de árvores frondosas, muitas flores e folhagens, tudo parrudo, crescido, vicejante. Comemos fruta-do-conde – doce, doce – ali no pé, no fim da tarde, depois de aguar as plantas, curtindo o cheiro agradecido da terra.


Mas antes disso, quando chegamos, beliscamos delicinhas, e eis o que essa minha amiga catarinense, sabidíssima das comidas e das receitas, ofereceu: pestisco de rabanete. Quem diria...

Cortam-se os rabanetes, depois de bem lavados, em rodelinhas não muito finas (com a casca, que é linda!). Sobre elas, passa-se um pouquinho de pasta de queijo com aneto (ou outra erva, a gosto); sobre a pasta, vai um pedacinho bem miúdo de castanha-do-pará (ou outra castanha, a gosto). Só isso.

O prato fica lindo com aquele monte de rodelinhas enfeitadas. Quanto ao sabor, fica apetitoso e refrescante. Muito bom com uma cervejinha bem gelada. Nossa!

Ela conta que onde nasceu se come o rabanete com manteiga. Nunca tinha visto ou ouvido falar. Uma descoberta.


Depois fomos visitar meu caro irmão. Caríssimo. E ele nos recebeu com uma jarrona de suco do maracujá colhido ali no quintal. Maracujá das primeiras floradas, saboroso até!

E papeamos mais e mais, até a noite trazer uma chuva forte, que foi bem bonito assistir da varanda.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

utensílios úteis


Com a confusão que houve por aqui na passagem do ano – o vazamento na pia, etc. –,  “descobri” utensílios na cozinha.

Fiquei chateadíssima por ter assim tanta coisa sem uso. É incrível isso de ter – por vezes chega-se à deselegância de crer que as coisas que temos é que dizem quem somos...
Não se trata de fazer de conta que não queremos ter coisas, dá sempre pra pensar que as posses são diferentes das propriedades por isto: possuir inclui a ideia de zelar por, usar, ocupar, incluir na vida; ter a propriedade de alguma coisa já não, pelo menos não necessariamente (basta pensar na especulação imobiliária pra entender isso...).
Então, por que ter que ter lugar pra guardar 27 potes plásticos, se só se usam dez ou onze? Se os outros são de tamanho ou formato que não nos atendem bem, por que tê-los? Pode parecer bobagem à primeira vista, mas isso é sério demais. Pra ficar nesse exemplo “universal”, lembremos que os potinhos plásticos são motivo de discórdia em muitas cozinhas e, se não isso, são motivo de praguejamentos, xingos ou risadas – como quando alguém abre a porta do armário só pra pegar um copo, e uma avalanche de tampas e caixinhas rola prateleira abaixo. Por mais que se arrumem esses potinhos plásticos, é uma questão de tempo eles se insubordinarem de novo, principalmente quando há mais de uma pessoa pilotando a cozinha. Mesmo que haja combinamentos, pactos, tratos, no correr dos dias e dos usos os danados vão se amontoando... É impressionante.
Vai daí que decidi ficar com meus onze potes úteis e fui dando o resto aos poucos, pra gente que queria, às vezes com um doce dentro, uns biscoitos, coisinhas gostosas.
Com isso, ganhei um pedação de armário. E até pude voltar a ter uns três potinhos pequenos de vidro – que são mais adequados pra microondas, por exemplo, ou pra pôr coisas em banho-maria. Os plásticos, parece que não são nada indicados pra essas tarefas, né?
Voltamos com isso à questão das práticas. Mas, afinal, de que mais uma cozinha é feita? Do amor que mora na gente (e varia conforme os dias, a estação do ano e tal) e de práticas (aprendidas, herdadas, inventadas, reinventadas, assumidas, transformadas...).
Pensando nisso, queria considerar duas coisas:
1. na cozinha, o bom mesmo, acho, é ter só o que se usa. Sempre dá pra cismar de querer algo novo, porque instrumentos adequados são tudo de bom nesse fazer de oficina que é cozinhar; mas sempre dá, também, pra ir liberando aquilo que caiu em desuso ou foi um presente precipitado, etc.
Além disso, é bom ter as coisas à vista, nada de armários profundos ou que ficam num “lá fora” distante aonde nunca ninguém vai. O negócio é ter poucas peças, que sejam boas e possam estar ao alcance dos olhos e das mãos; gosto de pendurar os utensílios do dia a dia nas paredes em torno da cozinha, ou deixá-los sobre mesas, prateleiras e armários, integrados aos movimentos de circulação.
Aliás, pra quem já não é mais tão jovem e flexível, isso é uma providência bem básica pra evitar os famosos “pequenos acidentes domésticos”... aqueles que acontecem com banquinhos irregulares "pra subir ali rapidinho", ou aquela agachadinha torta que "pega de jeito o ciático".
E, ainda por cima, com os utensílios pelas paredes, fica tudo com uma cara tão boa de “lar doce lar”.
2. também fora da cozinha é bem fácil mudar algumas práticas que podem fazer muita diferença pra já e pro futuro, pra todos nós seres viventes; é o caso, por exemplo, de preferir usar produtos de higiene e perfumaria produzidos por empresas que não maltratam animais em suas pesquisas: muitas marcas muito boas estão há tempos afinadas com uma pesquisa de alta tecnologia que não se faz a custo de sofrimento, que não perpetua, a cada produto, um sofrimento. Veja aqui a lista de marcas nacionais e internacionais que estão em boa sintonia.


E agora, vamos de folia, que carnaval é bom demais!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

arroz preto

Taí uma coisa que pouca gente usa aqui no Brasil e acho que por puro desconhecimento, porque já existe produção nativa há mais de dez anos, e os motivos pra adotar o arroz preto com frequência são muitos.

De saída, ele tem boa dose de proteína, muita fibra e antioxidantes (os tais compostos que combatem radicais livres, etc.). É muito saboroso, lembra a textura do arroz integral com vermelho – um pouco mais pra úmida do que o arroz parboilizado ou o branquíssimo, e mesmo o integral, que pode ficar bem sequinho, dependendo do modo de fazer, né?

Acho que o fato de o arroz ser preto (fica arroxeado no final do cozimento) é que espanta, talvez. É aquela história dos hábitos alimentares... Nossa cultura de séculos é a de um arroz assim, digamos, “quanto mais branco melhor” – ilusão, oh, que ilusão; puro apego à cultura do processamento, entendido como melhoramento. Já vimos aonde isso está nos levando, toda a problemática planetária, pra dizer o mínimo...

E, diante disso, muito se tem gritado sobre a importância de mudar práticas, aquelas miúdas decisões cotidianas que fazem a vida ter este ou aquele rumo, este ou aquele gosto, esta ou aquela contribuição pro todo. O símbolo disso no momento são as tais sacolinhas plásticas, essa desgraceira infiltrada em práticas tão variadas que, atônitos, não sabemos direito como mudar. Mas já sabemos o quanto é crucial que se mude. Logo.

Em todo caso, pensar só nas sacolinhas é pouco; é nada. Há muito mais a mudar, um sem-número dessas coisinhas de todo dia que, somadas a outras nem tão miúdas assim (como nosso voto político, por exemplo), vão dando um norte pra vida de todos nós. Na verdade, é preciso ter o espírito aberto e atento, não se trata de seguir uma cartilha de práticas impingida por uma ong X, por exemplo. A questão é o modo de ser, de estar no mundo, de se relacionar com o que está à volta, com quem está à volta.

Tudo isso porque acho que temos mil motivos pra incluir o tal do arroz preto no dia a dia, a despeito da cara feia que um e outro conservador possa fazer diante da tintura que surpreende. Acho que só espanta os que veem na brancura do arroz de sempre um sossego pra alma. Ledo engano.

Conta-se que há 4 mil anos, na China, só o imperador comia o arroz preto, iguaria destinada aos dirigentes espirituais de grandes povos, e por aí vai. Nos supermercados de hoje, há muito do arroz preto dito mediterrâneo, mas em boas casas de produtos naturais há do brasileiro, em caixinha ou a granel. É sempre melhor comprar comida que viajou menos, que passou por menos mãos e embalagens e estocagens...

Enfim, nutritivo até, o tal do arroz é de pôr no cardápio rotineiro. Embora, isso lá é verdade, ele faça um sucesso danado num jantarzinho pra amigos, acompanhando cambucis recheados ou algo assim. Hummm!

Hoje estou fazendo arroz preto com grãos de soja partida e farofa de aveia com tomates. Refeição substanciosa, saciante e bonita.

O arroz, faço de um jeito basiquinho: alho OU cebola refogados num fio de óleo de girassol, depois o arroz refogado um pouco junto, água, um ramo de salsinha OU um fiapo de alho poró OU de cebolinha, sal no fim do cozimento. No caso de pôr grãos de soja, acrescento-os logo depois da água. Também é gostoso misturar outro tipo de arroz (aquele tiquinho que sobrou de ontem ou anteontem) no fim do cozimento, depois do sal, quando já está quase na hora de desligar, sabe? Ele fica tingido, arroxeado como tudo o mais que se puser ali.

Quanto à farofa de aveia, numa frigideira, um fio de óleo quente recebe cebolas pequenas cortadas “em palito” (longitudinalmente) até que dourem, daí acrescentam-se um dente de alho esmagado, que frita um pouco, depois a aveia em flocos, que frita um pouco, depois os tomates em finos cortes longitudinais também, que também frita um pouco. É mais gostoso usar tomates que não estiverem muito maduros, pois sua função aí é dar um certo frescor ao prato.

E pronto!

Vou servir com rúcula regada de azeite e suco de umbu pra beber.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

maçã de pilequinho


Antes de mais nada, a pedidos, mostro a carinha da abóbora cavucada que fiz de novo na semana passsada.

E ofereço o link pra uma matéria muito interessante sobre cozinha molecular, simplicidade, variedade, sabor, saúde...
Agora, passo à “torta” de maçã ébria.
Com o calor que anda fazendo, apesar das chuvas de todos os dias, as maçãs que vieram na terça passada, já doces, bem madurinhas, precisavam virar alguma coisa... Eram oito maçãs das brasileiras, mas podem ser de qualquer tipo nesta receita, varia muito pouco o tempo de forno e sempre ficam apetitosas.
O negócio é o seguinte: depois de bem lavadas, as maçãs vão ficar umas duas, três horas de molho numa tigela com água e cachaça, na proporção 3 pra 1. Usei uma cachaça forte, artesanal, envelhecida em barril de madeira, que veio de Araxá. As maçãs ganham furinhos (pequenos mas profundos) feitos com um palito antes de serem mergulhadas nessa poção.
Quando já estiverem curtidas, é só cortá-las em finas fatias longitudinais, acompanhando o desenho da maçã, e ir fazendo camadas circulares numa travessa que vai ao forno. A cada camada, verte-se generosamente mel e asperge-se canela. E as camadas vão se sobrepondo com os mesmos gestos. Amém.
Por aqui foram 25 minutos de forno baixo com uma folha de papel alumínio por cima, pra não ressecar; na verdade, pra elas “cozinharem” em sua própria água – a ideia é que as maçãs fiquem bem cozidinhas. Ao tirar do forno, elas devem estar quase – quase! – desmanchando. Aí, com um garfo de dentes longos, a gente dá uma amassadinha geral, pra fazer uma pequena liga. Não é preciso amassar demais, como se fosse banana crua, por exemplo, pra fazer uma papa. É só de leve.
Por cima disso, derrama-se a seguinte mistura: 2 copos de iogurte natural (consistência firme é mais legal) mexido com mel, canela e uma colherinha de café de água de laranjeira OU água de rosas. OU. Só pra lembrar, são parfuns que devem ser usados com parcimônia, se não, ficam excessivos e roubam o solo das maçãs caneladas. 
Retomando: primeiro se mistura o iogurte com tudo isso aí, depois a mistura é distribuída sobre as maçãs assadas, algo amassadas e ainda quentes.
Deixa-se esfriar com um paninho por cima, só pra não cair nenhum bichinho, etc.
Daí, pelo menos duas horas de geladeira et voilà. Aqui na mesa, durou pouco mais de meia hora!
É que essa “torta” fica bem cremosa, docinha, aromática, mas leve como o quê. Então o povo come mesmo. Sem culpa e sem sobressalto.
Ah, desta vez salpiquei por cima de tudo, pra finalizar, umas amêndoas (cruas e cortadas em pedacinhos). Pode ser castanha de caju, castanha-do-pará, noz ou avelã – o lance é pôr pedacinhos pequenos e bem distribuídos, pra obter uma crocância certeira e agradável.
Por fim, pra quem não curte o espírito da cachaça, recomendo a mesma receita, só que com maçãs sóbrias.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

palitos de gengibre


Hoje fez sol, muito sol, e eu fiz abóbora cavucada de novo, só que com abóbora japonesa, aquela de casca mais escura, mais fina também.

Tem gente que chama de abóbora cabotiã. Bem, o que importa mesmo é que a casca dela é gostosíssima quando assada, então, a tal da receita fica particularmente propícia: não sobra nada, tudo é comível, deliciosamente comível, naquele beliscar sem fim de almoço apetitoso....

Agora, só pra lembrar, esse “de novo” aí é relativo, porque, como disse outro dia, há sempre algo que se inventa na hora, conforme o que se tem à mão na cozinha.


E hoje também ganhei uma receita bacaníssima, de uma outra luciana numa outra cozinha – veja só que divertido é isso das cybercozinhas: encontram-se como num passe de mágica, alegres por se encontrarem!

Reproduzo o que ela ensinou:

- cortar em tiras bem finas um pedaço de gengibre (do formato e tamanho de um palito de fósforo) 

- acrescentar 50 mL ou 5 colheres de sopa cheias de shoyo numa panela e dar uma aferventada no gengibre

- em seguida, colocar uns 15 tomates cereja divididos ao meio, 5 shitakes fatiados, 5 ramos de brócolis já cozidos (o comum, não o japonês) e duas cebolas cortadas como se fossem desfiadas 

Ou seja: corta-se ao meio, deita-se a cebola na mesa e corta-se verticalmente, no sentido da camada

- ferver tudo junto, até cozinhar
- se preciso, colocar sal e mais shoyo.

É uma receita rápida, dá para congelar, e fica saborosa demais.
Ah, tofu acompanha bem, e cebolinha tb!

Não parece tudo de bom?

Pra quem torceu o nariz quando leu “shoyo”, aviso que: 1. os chamados light são realmente mais suaves e cumprem muito bem a função; 2. tudo isso aí ficará bem gostoso também com molho de laranja, aposto.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

truque de cenoura

Vou viajar a trabalho, então tenho evitado abastecer a casa, ou seja, tenho tentado funcionar com o que tem, com o que dá. Exercício maravilhoso de criatividade! E de simplicidade também – o que vai muito bem, diga-se, nestes tempos em que o excesso (de tudo) é o que nos mata, ou adoece.

Pois eu abri a gaveta da geladeira hoje e encontrei um monte de cenourinhas, daquelas pequeninas, organicíssimas, suculentas (leia-se gostosas e cheias de suco), mas começando a querer murchar... Vieram na cesta da Sementes de Paz da semana passada, e até hoje eu não lhes tinha dado destino.
Havia, ainda, uma couve-flor, só 3 ovos, um pedaço de queijo padrão bem macio, maturado que só. De fresco, nada além de tomate e salsinha (linda, aliás; firme e forte como ninguém mais por ali - tem a ver com o modo de lavar, deixar secar e guardar na geladeira dentro de um pote bom, que não a machuque). Então era isso.

Fiz um arroz integral com vermelho – que fica ligeiramente umedecido, faz parte dos arrozes que confortam (há os que desafiam, tipo arroz preto, selvagem, arbóreo...). No tempero: cebola frita em metades num fio de óleo, salsinha, um tico de sal no final do cozimento (sempre que possível, o sal deve ir no final do processo: usa-se menos quantidade, porque nada se perde “do gosto” dele, e se preserva o iodo, tão importante pra nós).

A couve-flor cozida no vapor virou salada com pedaços de tomate: arvorezinhas e triângulos de tomate – hoje deixei as sementes. E fiz um molho di-vi-no: no liquidificador, bati um copinho de iogurte natural e todas as folhinhas aproveitáveis do maço de manjericão que veio na semana passada (já mais pra lá do que pra cá, nesta altura), azeite extra-virgem, pitada de sal. Pode guardar o que sobrar, porque fica bom com pão (basta acrescentar mais azeite, fica um antepasto ótimo com pães brancos, biscuits, etc.), no meio de sanduíches de queijo, sobre massas secas... Bom mesmo! O truque é deixar bater bastante, espumar, e geladeira nele até a hora de servir.

Finalmente, as cenouras, razão de tudo isso. Tirei raízes e folhas, limpei mais uma vez, aproveitando ao máximo a casquinha (antes de ir pra geladeira, elas foram bem lavadas, ficaram de molho no hipoclorito de sódio e tudo, embora não tenham sido cortadas – porque assim duram mais), joguei tudo no liquidificador, um punhado bom de salsinha, uma colher de café de sal, meio copo de leite (uso desnatado, em pó), os 3 ovos que havia, uma cebola média, 2 dentes de alho refogados na manteiga, daquele jeitinho de que já falei, um pouco de noz-moscada ralada na hora, um fio de azeite.

Enquanto isso bate bem-bem-bem, rala-se o queijo. Do queijo ralado, um punhadinho pequeno foi pro liquidificador, o mais serviu de cobertura. Bati quase um minuto, acho.

Numa forma refratária, derramei o denso creme laranja-esverdeado; por cima dele, distribuí o tal do queijo.

20 minutos de forno à temperatura média pra alta e pronto: eis uma “tortinha” de cenouras, todas elas salvas da gaveta bem na hora!

Dois comentários reveladores aconteceram nesse almoço feito em 50 minutos: um carnívoro de plantão que baixou por aqui hoje ficou dizendo “quem bom, que bom, nem precisa de mais nada” (um pouco com aquela cara típica de quem só come carne e nem imagina como é não comer); o outro vinha de quem tinha passado mal ontem, com exageros gastronômicos, espumantes variados e que-tais, e dizia “não conseguia comer nada, tava embrulhado... mas isso aqui tá muito gostoso, leve, recompõe”.

Gregos e troianos estavam assim na minha cozinha hoje, próximos, deleitosos, convergentes. E lá fora chovia, ainda agora chove... chove de fazer dó.